quinta-feira, 21 de março de 2013


José Jorge Letria

MAR PORTUGUÊS
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa


As Lágrimas São Netas Do Mar

Vieram dizer ao Mar
que o Sal
andava a portar-se mal.

Quem veio meter
minhocas na cabeça do velho Mar
foi a Areia e a Espuma.
Tudo porque o Sal
era bonito
e não lhes ligava nenhuma.

De queixinha em queixinha,
disseram ao Mar
que o Sal
tinha uma namoradinha.


Chamava-se Gota de Água.
Era linda,
branca, cristalina
e tinha vindo do Céu Azul.

As duas,
com dores de cotovelo,
contaram ao Mar
as conversas de amor
que tinham ouvido
quando o Sal estava a namorar
muito entretido.

Então,
a Areia disse que a Gota de Água
falou assim para o Sal:
Meu bem amado,
se quiseres casar comigo
deixarás de ser salgado.

E a Espuma disse que o Sal respondeu à Gota de Água:
Minha ternura,
por ti deito o salgado fora
e fico uma doçura.

E neste disse-que-disse,
as duas marotas aproveitaram a maré e
de tal maneira
atazanaram o velho,
que os seus cabelos ficaram em pé.

- O Sal virar doçura? – pensou o Pai Mar.
E, ao pensar nisto,
deixou entrar a tristeza e a amargura
no seu imenso coração.

O Pai Mar nem queria acreditar.
Então,
ele,
pai,
criou o Sal, desde catraio até homem feito,
feito para conservar
a beleza e a saúde dos habitantes do seu reino
- os peixes –
e o rapaz queria tornar-se doçaria?
Não podia!!!

Chamou o filho e disse-lhe:
- Filho, tem paciência,
se continuas com o namoro,
considero desobediência.

O Sal
fez ouvidos de mercador,
encolheu os ombros,
e continuou o seu grande amor…
pela Gotinha de Água.

Ao saber
o que o filho tinha decidido,
o Mar ficou bravo,
enraivecido,
tornou-se turbilhão, e foi grande a aflição:
as Ondas andaram numa fona,
os Mexilhões levaram tapona,
a Baleia veio respirar à tona,
um Cavalo-Marinho
tropeçou num penedo e partiu o focinho.
Até uma Gaivota,
de perna manca,
que era vizinha do Mar,
teve de dar à perna para não se afogar.

O velho Mar,
amargurado e furioso,
pôs o filho fora de casa,
em terra.

Mas o sal não se importou.
Casou.
Mas, como não havia casas para alugar,
o Sal e a Gota de Água
foram morar
para os olhos das pessoas.

É por isso
que, quando estamos tristes e amargurados nos nossos corações,
choramos.
E as nossa lágrimas
são salgadas
porque são filhas do Sal e da Gota de Água
e… netas do Mar.

In “Para Sonhar com Borboletas Azuis”
de José Vaz com ilustrações de Luisa Brandão

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.